“OS SHOPPING CENTERS DE LUXO”

Por Michel Cutait em 29 de março de 2017

Dentro da indústria de Shopping Centers existe um segmento que se desenvolveu bastante nos últimos anos, especialmente fomentado pela chegada de muitas marcas internacionais e pelo amadurecimento do mercado consumidor que passou a ter mais acesso aos bens de consumo de luxo.

O crescimento do mercado de luxo no Brasil teve alguns protagonistas importantes, como o Shopping Iguatemi São Paulo, o Shopping Cidade Jardim, a operação Daslu, o Shopping JK, e posteriormente o Village Mall no Rio e o Pátio Batel em Curitiba, além de outras operações que agregaram muito à oferta de produtos e serviços de marcas renomadas no mundo inteiro.

A crise brasileira chegou, e trouxe consequências muito preocupantes para a economia no país, que também afetou o mercado de Shopping Center e Varejo, e consequentemente, afetou também o mercado de luxo.

Hoje, os principais desafios de um Shopping de Luxo no Brasil são basicamente econômicos.

Do ponto de vista mercadológico, o Brasil ainda oferece condições muito interessantes para operações de luxo e empreendimentos com este posicionamento, porque existe uma demanda ainda não satisfeita para consumir produtos e serviços de luxo, baixa concorrência e mercados pouco explorados.

Entretanto, do ponto de vista econômico, a crise econômica gerou consequências sérias para o mercado de luxo, porque diminuiu a reserva financeira de todas as camadas da população economicamente ativas, e mesmo as pessoas com mais condições financeiras, preferiram reduzir o consumo, especialmente dos artigos de luxo, para priorizar áreas mais importantes e até mesmo para diminuir riscos diante das incertezas do mercado.

Ainda que muitos produtos e serviços continuem sendo prestigiados pelos consumidores, especialmente aqueles itens considerados como “fashion icons” ou “must have”, que seguem com um público fiel às novidades, em geral, a diminuição do consumo impacta diretamente no mercado de luxo, porque precisa rever custos, diminuir margens, ampliar o CRM, investir em marketing e atrair o público de uma forma mais efetiva e profunda.

Um Shopping de luxo deve manter algumas características especiais para se diferenciar dos demais empreendimentos, a primeira delas é sua vocação para o “lifestyle”, porque precisa transmitir e oferecer um equipamento que seja mais do que um centro de compras, mas um empreendimento que represente um estilo de vida, um comportamento diferenciado e exclusivo para consumidores que mantêm uma identidade com esse posicionamento.

Além disso, um Shopping de luxo precisa ter um “tenant mix” diferenciado, com marcas exclusivas, reconhecidas internacionalmente pela sua qualidade, com produtos especiais, raros, caros e únicos, dentro de um espaço projetado com um design e uma arquitetura moderna, sofisticada e avançada, que ofereça serviços e conveniências personalizadas, novas experiências de consumo e que basicamente mantenha com seus clientes e consumidores uma relação mais profunda, com sentimentos de afinidade e fidelidade bastante desenvolvidos.

Os Shopping Centers de luxo enfrentam problemas semelhantes aos demais empreendimentos, porém para que sejam empreendimentos destacados, melhores que a concorrência e aclamados pelos consumidores, o nível de esforço que esses empreendimentos precisam fazer é consideravelmente maior, porque o mercado de luxo é muito mais exigente, os consumidores não se satisfazem com facilidade, buscam sempre o melhor e são muito informados das novidades e tendências, exigindo estratégias muito elaboradas para atrair e manter esses consumidores sempre interessados nas ofertas, produtos e serviços que estão nos Shopping Centers.

Em geral, esses empreendimentos são os primeiros a adotarem inovações e novas estratégias para cativar o mercado consumidor, por isso, buscar as tendências mais relevantes são essenciais para que esses empreendimentos mantenham o nível de relacionamento com seus consumidores, entre elas:

–      apostar na tecnologia para facilitar a comunicação com o consumidor;

–      explorar o empreendimento como um centro de convivência e experiências;

–       desenvolver soluções, serviços e conveniências cada vez mais individualizados;

–      investir em arte, cultura e design;

–      manter uma agenda de eventos e ações de marketing exclusivos;

–      estabelecer um relacionamento profundo com seus clientes, para que cada consumidor seja um “embaixador” da marca; e

–      conciliar as ferramentas online, especialmente aquelas pelo mobile, para que as lojas, os pontos de venda e os varejistas transformem seus espaços físicos em espaços “fulfillment” onde o consumidor poderá explorar todas as experiências da forma ampla, completa e que satisfaça suas vontades.

Diante da situação econômica atual, o ano de 2017 não deverá ser um ano de expansão, mas será um ano de aperfeiçoamento, melhorias e incrementos, um ano para investir na comunicação, no atendimento e no relacionamento com o consumidor. Algumas marcas de luxo devem sair do cenário, mas outras novas operações devem chegar abastecendo o mercado com novidades, mantendo um equilíbrio bastante positivo para um ambiente econômico ainda fragilizado pela crise, mas que já demonstra recuperação este ano.

Especificamente no mercado de luxo, este ano é um ano em que as operações precisam apostar mais do que no renome, no prestígio e na força da marca. Não adianta abrir a loja e acreditar que os clientes vão entrar simplesmente porque a marca é reconhecida no mercado. É preciso fazer mais e fazer melhor.

Além disso, há dois elementos muito importantes que precisam ser revistos, especialmente quando as marcas internacionais entram num mercado como o brasileiro.

Primeiro é a questão do atendimento, porque os consumidores brasileiros têm ou tiveram pouco acessos aos bens de consumo de luxo, e por essa razão, o atendimento não deve pressupor que esses consumidores saibam de todas as tendências, da história da marca, dos processos produtivos por trás de cada item, etc, exigindo mais cuidado, atenção e generosidade na hora de atrair, receber e desenvolver o processo de compra desses bens.

Segundo é a questão do visual merchandising que, normalmente, vem de “cima para baixo”, definido pela matriz das empresas, usando linguagens, modelos e apresentações que nem sempre têm aderência ao mercado brasileiro, como itens muito extravagantes para os costumes dos consumidores brasileiros, estações invertidas com oferta de itens de outono/inverno quando o verão esquenta os ânimos no Brasil, ou itens de primavera/verão quando os consumidores estão experimentando um pouco do pequeno frio que faz por aqui,.

A política de “pricing” também uma questão importante, porque ainda se apresentam com uma margem muito alta para a capacidade econômica dos consumidores brasileiros, apesar da prática de “parcelamento” largamente adotada no Brasil já foi incorporada pelas marcas, que trouxe maior incremento nas vendas.

Por trás de cada marca há uma história, uma significado, um conjunto de qualidades que fizeram com que a marca fosse reconhecida como uma marca de luxo, e, na minha opinião, é necessário que essas marcas façam um “back to the basics”, que resgatem esses valores, apostem na exclusividade, que incorporem os consumidores como co-autores da história que pretendem contar, e que voltem a cativar os clientes oferecendo experiências novas, antecipando a demanda, estimulando as aspirações dos novos consumidores e fortalecendo o relacionamento com os clientes que já são fiéis à marca.

Em termos de Market Share, o Brasil ainda é um país muito concentrado em termos econômicos, puxado por São Paulo e o Sudeste, e, naturalmente, o mercado de luxo encontra mais ofertas nesses lugares.

Porém, já está em curso, faz alguns anos, um processo de interiorização ou regionalização do mercado de varejo e de Shopping Center, criando um caminho para o crescimento do mercado de luxo e “premium” no Nordeste e em outras capitais brasileiras.

A riqueza ainda não está bem distribuída, mas as regiões Nordeste e Centro-Oeste cresceram e se desenvolveram, e muitos novos consumidores, com fácil acesso às informações, romperam as fronteiras, e não se satisfazem com as ofertas de produtos e serviços básicos ou normais, desejando entrar no mercado de luxo com bastante vontade, curiosidade e interesse.

Ainda que a proporção do mercado para o segmento de luxo seja pequeno no “interior”, existe, com absoluta certeza, um espaço muito promissor para o crescimento, cuja expansão precisa ser muito bem planejada, e, especialmente, muito bem trabalhada, não só no lançamento, mas também na manutenção do relacionamento com esses novos consumidores, ou se isso não for o ideal, então, que as marcas de luxo encurtem os caminhos para aproximar esses consumidores às capitais, e assim, permitir que eles também tenha acesso às suas ofertas.

O mercado de luxo é voltado para um determinado nicho de consumidores e clientes que encontram e reconhecem um valor agregado diferenciado nos produtos e serviços que são oferecidos pelas marcas e pelas empresas. Esse valor agregado em geral é um valor abstrato, que supera simplesmente a qualidade da matéria-prima, do acabamento e da qualidade dos bens, porque gera no consumidor um sentimento de identidade, de vínculo pessoal com a marca, criando um relacionamento profundo a ponto do consumidor criar hábitos como “colecionismo” e alta fidelidade aos produtos e aos serviços que eles gostam.

A economia brasileira não está ajudando o mercado de luxo, mas, mesmo assim, esse segmento tem muitas oportunidades para explorar, e se fizer um bom trabalho de “tropicalização”, ou seja, de adaptação às aspirações, necessidades e vontades do consumidor, incrementar as estratégias de relacionamento com base no resgate de seus valores de origem e na individualização do atendimento e apostar no uso da tecnologia e das inovações para atrair, manter e fidelizar os clientes, vai encontrar um mercado que tem força para crescer com sustentabilidade.

Michel Cutait

Michel Cutait

Michel Cutait é especialista em Shopping Center e Varejo. Diretor da Make it Work, empresa especializada no desenvolvimento, planejamento, elaboração, produção, execução e administração de negócios para o mercado de Shopping Center e Varejo. Trabalha há 22 anos no mercado, tendo colaborado diretamente para mais de 100 empresas, incluindo 70 Shopping Centers e diversos varejistas, totalizando a gestão de ativos equivalente a US$ 5 bilhões em receita, 1,7 milhões m2 de Área Bruta Locável (ABL) e 11,2 mil lojas em operação. Além disso é advogado no Brasil e Portugal, escritor, perito, consultor e professor de cursos de extensão e pós-graduação em Shopping Center e Varejo, tendo ministrado aula para diversas Universidades como ESPM, Fundação Dom Cabral, Universidade Positivo e outras. Também apresenta palestras e realiza treinamentos sobre temas ligados ao mercado de Shopping Center e Varejo. Fez Mestrado em Gestão e Tecnologia na EPFL na Suiça, Marketing pela Curtin University na Austrália e Mestrado em Relações Sociais pela PUC/SP. Formado em Direito pela UNESP/SP. Certificado em Empreendedorismo em Varejo na Babson College em Boston/USA e Mercado de Ações pela BMF&Bovespa. Também estudou Doutorado em Ciências Jurídico-Economicas na Universidade de Lisboa em Portugal e MBA em Gestão de Shopping na FGV/SP. Administra e mantém o grupo "Shopping & Varejo" na rede de negócios do Linkedin.
Contato: michel@makeitwork.com.br
Michel Cutait

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